Senadores questionam Kassio sobre aborto e outros temas polêmicos

Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) se reúne em sistema semipresencial para sabatina de indicado para exercer o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).   As reuniões ocorrem de forma semipresenciais, sendo permitida a participação remota dos senadores através de um aplicativo de videoconferência, para debate com os indicados e leitura de relatórios.   Mesa (E/D):  indicado para exercer o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Kassio Nunes Marques;  presidente da CCJ, senadora Simone Tebet (MDB-MS);  relator ad hoc, senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG).   Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Aborto, proteção ao meio ambiente e direitos das minorias também foram temas abordados pelos senadores durante a sabatina do indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF), Kassio Nunes Marques (MSF 59/2020). Ele não os respondeu forma definitiva, já que há processos em curso sobre os assuntos nos tribunais brasileiros, e a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman – Lei Complementar 35, de 1979) impede os juízes de se manifestarem, sob pena de responderem a sanções disciplinares.

— Peço desculpas por não ser incisivo, por não dar uma resposta cirúrgica em relação a como penso. Isso não gera só um impedimento. Se aqui estivesse um advogado indicado, ele, ao se pronunciar, geraria um impedimento para eventual julgamento. No meu caso, há uma incidência dupla: além de um eventual impedimento, se eventualmente esta Casa não vier a aprovar o meu nome, vou voltar fisicamente para o TRF da 1ª região e estarei submetido à sanção disciplinar porque eu estaria aqui, diante de Vossas Excelências, descumprindo uma lei federal — justificou Kassio a uma pergunta do senador Eduardo Girão (Podemos-CE).

Girão questionou o desembargador sobre seu posicionamento em relação ao aborto. O senador chegou a exibir um molde de feto, para mostrar a formação dos órgãos e o seu tamanho com poucas semanas, quando costuma acontecer a interrupção da gestação nos casos permitidos pela Justiça. Mesmo impedido de se manifestar claramente, Kassio salientou:

— Meu lado pessoal eu deixei bem claro na minha apresentação: sou um defensor do direito à vida e tenho razões pessoais para isso. Se eventualmente for necessário, até o final eu exponho questões familiares, questões pessoais, experiências por mim vividas. A minha formação é sempre em defesa do direito à vida.

Girão aproveitou para explanar seu voto contrário à indicação, por considerar que Kassio não se mostrou adequadamente alinhado a vários temas que o senador considera caros.

Meio ambiente

Já Fabiano Contarato (Rede-ES) citou o direito a um meio ambiente equilibrado garantido constitucionalmente a todos os brasileiros e questionou uma decisão de Kassio Marques que, segundo o senador, havia permitido o aumento do desmatamento em um território protegido de Rondônia, o Parque Guajará-Mirim. O sabatinado disse que apenas deu autorização de passagem, temporária, por uma picada que já existia no local sem que houvesse pavimentação, porque o estado sofria com as cheias do Rio Madeira, que deixaram vários municípios isolados e sem medicamentos e alimentos.

O senador também questionou o indicado sobre os direitos obtidos judicialmente pela comunidade LGBTQIA+, como casamento civil e permissão de adoção, criminalização da homofobia, uso de nome social por homens e mulheres trans — não sem antes criticar o Parlamento que, segundo ele, é composto em sua maioria por homens brancos e ricos e é pouco diverso, por não assegurá-los em diplomas legais.

— Minha opinião como operador do Direito é que esses limites foram atingidos, ou seja, há uma certa pacificação social no que diz respeito a isso. Agora, compete ao Congresso Nacional — e eu reconheço as dificuldades que Vossa Excelência mencionou — fazer a transformação dessa jurisprudência em norma, possibilidade em que ela pode ser alterada, aperfeiçoada, adequada às circunstâncias do momento. Mas, pelo que eu percebi, todos os temas mencionados já são temas julgados pelo Supremo Tribunal Federal e estão em plena eficácia na sociedade brasileira — disse Kassio.

Ligado ao tema, o senador Marcos Rogério (DEM-RO) perguntou a Kassio sobre decisões do Supremo como o enquadramento do crime de homofobia como crime de racismo e a discussão de temas como aborto e drogas. Segundo Marcos Rogério, o Judiciário despreza nesses casos o devido processo legislativo e o papel do Congresso.

— Existem alguns temas sensíveis em nosso país acerca dos quais o Congresso Nacional por sua maioria legisla de forma negativa, ou seja, aprecia e rejeita proposições que sancionam determinadas condutas como aborto, uso de drogas e homofobia. A Supremo Corte deve ser a guardiã da Constituição e não subscritora — criticou o senador.

Em resposta, Kassio Marques preferiu não se posicionar especificamente sobre os temas para não ficar impedido de participar de futuros julgamentos, mas reafirmou que é um “garantista”.

— Por vezes, o garantista precisar ser ativista. Não é um progressista que está criando políticas públicas, mas também não se limita a declamar o texto frio da norma.

Terras indígenas

O senador Renan Calheiros (MDB-AL) abordou a questão indígena, e o artigo da Constituição que diz ser competência exclusiva do Congresso Nacional “autorizar, em terras indígenas, a exploração e o aproveitamento de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de riquezas minerais”. Ele perguntou se o indicado concorda que o Poder Executivo e o Supremo Tribunal Federal podem deliberar acerca do assunto.

— Sobre a questão indígena, Vossa Excelência fala da autorização para exploração. Essa matéria está também sendo discutida, e eu peço permissão, pelas razões que esposei, para não me imiscuir, porque já há decisão nesse sentido, o limite dessa regulamentação, qual é a competência do Executivo, qual é a competência do Poder Legislativo em editar normas relativas a essa matéria — disse.

Lagosta

O senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO) criticou o indicado por liberar uma licitação do STF para a compra de itens de luxo, como lagostas e vinhos premiados. Kajuru disse que, embora legal, a decisão seria eticamente discutível, já que representou “a continuação de regalias revoltantes num país miserável”.

Kassio defendeu que não se pode confundir a alimentação rotineira dos ministros e servidores do tribunal com eventuais recepções de autoridades. Para esse tipo de evento, não seria possível contratar um restaurante e a licitação se faz necessária com certa antecedência, por isso a autorização.

— Essa licitação não é para almoço dos ministros, para lanche dos ministros. É feita como existe em todas as instituições brasileiras, para também bem receber convidados ilustres. E foi o que o Supremo fez. Ela foi inspirada em uma licitação do ministério das Relações Exteriores — justificou.

Fonte: Agência Senado

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