O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi condenado, nesta quarta (12), a 9 anos e 6 meses de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex de Guarujá (SP).
A sentença do juiz Sergio Moro é a primeira contra o petista no âmbito da Lava Jato.
O petista não será preso –pelo entendimento do Supremo, só começará a cumprir a pena se a segunda instância ratificar a decisão. Ele poderá recorrer em liberdade ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, com sede em Porto Alegre. Se a confirmação da sentença na segunda instância não acontecer antes da eleição de outubro de 2018, ele não será enquadrado na Lei da Ficha Limpa e poderá ser candidato.
O tribunal leva, em média, cerca de um ano e meio para analisar as sentenças de Moro.
Na ação, Lula é acusado de receber R$ 3,7 milhões de propina da empreiteira OAS em decorrência de contratos da empresa com a Petrobras. O valor, apontou a acusação, se referia à cessão pela OAS do apartamento tríplex ao ex-presidente, a reformas feitas pela construtora nesse imóvel e ao transporte e armazenamento de seu acervo presidencial.
Moro, porém, absolveu o ex-presidente na acusação sobre o acervo presidencial.
Na sentença, o juiz afirmou que a prisão imediata de um ex-presidente “não deixa de envolver certos traumas” e que a “prudência” recomenda que se aguarde o julgamento em segunda instância.
Ele disse ainda no despacho que “até caberia cogitar” o decreto de prisão diante do comportamento de Lula, com medidas de intimidação ao juiz e outras autoridades, e de episódios de orientação de destruição de provas.
Moro também condenou Lula ao pagamento de multa equivalente a R$ 670 mil.
O ex-presidente, que sempre negou as acusações, ainda responde a outras quatro ações na Lava Jato, uma delas conduzida por Moro e outras três na Justiça Federal de Brasília. O petista ainda não foi sentenciado em nenhuma delas.
Na última pesquisa Datafolha, em junho, Lula, que vem afirmando que será candidato em 2018, aparece em primeiro lugar nas intenções de voto.
RÉUS
Para Moro, Lula tinha “um papel relevante no esquema criminoso” da Petrobras, já que cabia a ele indicar os nomes dos diretores da estatal, e os álibis invocados por sua defesa, que argumenta que o apartamento jamais esteve no nome do petista, são “falsos”.
“Luiz Inácio Lula da Silva foi beneficiado materialmente por débitos da conta geral de propinas, com a atribuição a ele e a sua esposa, sem o pagamento do preço correspondente, de um apartamento triplex, e com a realização de custosas reformas no apartamento, às expensas do grupo OAS”, escreveu o magistrado.
Segundo Moro, foi “um crime de corrupção complexo e que envolveu a prática de diversos atos em momentos temporais distintos”.
Ainda foram condenados, além de Lula, os executivos da OAS Leo Pinheiro e Agenor Franklin Medeiros.
O presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, que providenciou o transporte do acervo presidencial, foi absolvido, assim como os funcionários da OAS Paulo Gordilho, Fábio Yonamine e Roberto Ferreira.
A ex-primeira-dama Marisa Letícia, morta em fevereiro, também era ré no processo, mas teve a punibilidade extinta em março por Moro.
OUTRO LADO
Os advogados de Lula ainda não se manifestaram sobre a sentença.
Eles vêm argumentando que a ação contra o petista é uma perseguição judicial por parte do Ministério Público Federal e da Lava Jato.
Segundo a defesa, a OAS não tinha como ceder a propriedade ou prometer a posse do imóvel ao ex-presidente.
O advogado Cristiano Zanin Martins afirma que a empreiteira transferiu os direitos econômicos e financeiros do tríplex a partir de 2010 para um fundo gerido pela Caixa Econômica —o que invalidaria a acusação do Ministério Público Federal.
Em depoimento a Moro, Lula declarou que não é dono do apartamento no Guarujá, que desistiu da compra do imóvel e que, por isso, não há como acusá-lo de ter recebido vantagens.
Para a defesa, a acusação se baseia em um “castelo teórico”, e a análise “racional, objetiva e imparcial das provas” leva exclusivamente à absolvição do ex-presidente.
POWERPOINT E BATE-BOCA
A condenação é o desfecho de um processo marcado por embates entre a defesa, o juiz e os procuradores da Operação Lava Jato. O ápice da tensão ocorreu no dia 10 de maio, quando Lula depôs por cinco horas, sob forte esquema de segurança, e chegou a trocar alfinetadas com o juiz na audiência.
A defesa fez críticas quase diárias ao juiz e tentou tirar o processo de sua responsabilidade, argumentando que a corrupção na Petrobras já é alvo de outro inquérito no Supremo Tribunal Federal.
Antes mesmo do início do processo, o caso já despertou grande polêmica. Primeiro, em março de 2016, ainda em fase de inquérito, Lula foi levado para depor de maneira coercitiva por ordem de Moro, medida questionada no meio jurídico.
Meses depois, em setembro, uma entrevista coletiva dos procuradores para a apresentação da denúncia gerou controvérsia por causa da apresentação de um slide em PowerPoint em que o nome de Lula era mostrado como o centro do esquema de corrupção na Petrobras.
A trajetória de Lula
1945
Garanhuns
Nasce em Garanhuns (PE). Em 1952, muda-se com a família para o Guarujá (SP) e, três anos depois, para São Paulo
1975
Sindicato
É eleito presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Reeleito em 1978, organiza as primeiras greves do ABC durante a ditadura militar (1964-1985)
1980
PT
PT é fundado em São Paulo; Lula é escolhido presidente do partido com 70% dos votos
1982
Eleição SP
Na primeira eleição do PT, Lula concorre ao governo de São Paulo e fica em quarto lugar
1986
Deputado
PT elege 16 deputados federais, entre eles Lula (o mais votado do país, com mais de 600 mil votos)
1988
Constituição
PT, do qual Lula era líder, se recusa a aprovar a Constituição de 88. Anos mais tarde, ex-presidente diz apoiar o texto
1989
Collor
Lula concorre à Presidência pela primeira vez e é derrotado por Fernando Collor (PRN)
1992
Impeachment
Como presidente do PT, é um dos articuladores da abertura do processo de impeachment de Collor
1994
FHC 1 x 0
Perde eleição à Presidência para Fernando Henrique Cardoso (PSDB) no primeiro turno
1997
CPEM
O advogado Roberto Teixeira, que cedeu a Lula um imóvel onde ele morou de graça de 1989 a 1997, é acusado de ajudar empresa a obter contratos com prefeituras petistas
1998
FHC 2 x 0
Lula disputa mais uma vez com FHC e perde no primeiro turno
2002
Presidente
É eleito presidente vencendo José Serra (PSDB). Com a “Carta ao Povo Brasileiro”, o PT firma compromisso com uma política econômica ortodoxa
2005
Mensalão
Em entrevista à Folha, deputado Roberto Jefferson (PTB) acusa petistas de comprar apoio no Congresso. O escândalo do mensalão faz José Dirceu e outros dirigentes do partido sairem do governo
2006
Reeleição
Lula é reeleito com 60,8% dos votos
2014
Lava Jato
Polícia Federal deflagra a Operação Lava Jato, que descobre um esquema bilionário de desvios na Petrobras
2015
Pixuleco
Torna-se alvo dos protestos contra o governo e inspira a criação de um boneco gigante, o Pixuleko
2016
Alvo da PF
Torna-se alvo da Lava Jato por suspeitas envolvendo um tríplex em Guarujá e um sítio em Atibaia. Também é investigado na Operação Zelotes
2016
Ministro
Em março, a então presidente Dilma Rousseff nomeou Lula como ministro da Casa Civil. O PSDB e o PPS moveram um mandado de segurança para suspender a nomeação por “desvio de finalidade”, alegando que Lula, investigado na Lava Jato, tinha como objetivo sair da jurisdição de Sergio Moro. O ministro do STF Gilmar Mendes acatou o pedido e Lula perdeu o cargo
2016
Impeachment
Apesar das tentativas de articulação de Lula para salvar o mandato de Dilma Rousseff, ela foi afastada temporariamente pelo Senado no dia 12 de maio de 2016. Em 31 de agosto, Dilma perdeu o cargo definitivamente, em votação na mesma Casa, por 61 votos a 20
2017
Morte de Marisa
Marisa Letícia Lula da Silva, mulher do ex-presidente, morreu no dia 3 de fevereiro, aos 66 anos, vítima de um AVC
2017
Depoimento a Moro
Lula depôs ao juiz Sergio Moro, em Curitiba, no dia 10 de maio, e voltou a negar envolvimento em atos ilícitos
Poder de S. Paulo