Comissão aprova transferência dos recursos do salário-educação da União para os estados e municípios

Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE) realiza reunião com 13 itens. Entre eles, o PL 5.695/2019, que transfere a cota da União do salário educação para estados e municípios.  Senadores  Izalci Lucas (PSDB-DF) e Paulo Paim (PT-RS) à bancada conversa com convidados e participantes durante reunião.  Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Uma polêmica tomou conta da sala da Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE) na manhã desta terça-feira (12). Representantes de sindicatos, associações de agricultores familiares e servidores do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) se juntaram para contestar o projeto que deve liberar cerca de R$ 9,3 bilhões do salário-educação para os estados e municípios já em 2020 (PL 5.695/2019). Apresentada pelo senador Izalci Lucas (PSDB-DF), a proposta prevê que o recurso saia direto do Tesouro Nacional para os entes federados. Dessa forma, o aporte não é considerado como despesa da União, e, portanto, não fere o teto de gastos do governo federal.

— A única forma de aumentar o orçamento para a educação era tirar esse dinheiro (do salário-educação) do teto. Na prática, com esse projeto é possível colocar mais R$ 9 bilhões na educação, se você tira mais do salário-educação dos gastos do governo federal e já faz a distribuição diretamente para os estados e municípios — disse o senador.

Izalci Lucas disse que tem pressa. Ele participa da subcomissão do Orçamento 2020 para a educação e, em sua opinião, se no Orçamento de 2019 as verbas para a educação já foi insuficiente, o de 2020 será pior, com cortes na educação e bolsas de estudo que não foram pagas. O senador apontou uma corrida contra o tempo, pois ele tem até o dia 17 de novembro para tentar colocar mais dinheiro no Orçamento da educação. E o projeto, de sua autoria, ainda não passou pela Câmara.

— Nosso único objetivo aqui é garantir mais R$ 9 bilhões para a educação sem prejudicar nada. É uma janela de oportunidade que não podemos perder em 2020 — disse Izalci, defendendo a aprovação imediata da proposta.

Uma audiência pública conjunta foi marcada pela CE e pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) na segunda-feira, às 14h, que vem para que especialistas de educação e representantes de diversas categorias sejam ouvidos. A tentativa dos senadores é conseguir ouvir os segmentos desfavoráveis à proposta sem perder o prazo. A votação de mérito será terminativa na CAE. Se aprovada a matéria, ainda passa por votações na Câmara antes de chegar à Comissão Mista do Orçamento.

A aprovação na CE foi feita depois de modificações sugeridas pelos representantes do FNDE e de sindicatos, que protestavam contra a proposta. O temor era a descontinuidade dos programas de Alimentação Escolar (Pnae), de Apoio ao Transporte do Escolar (Pnate), do Livro e do Material Didático (PNLD) e o Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) e o impacto disso no dia a dia dos alunos. Izalci garantiu que nada disso deve mudar e uma emenda foi costurada durante a reunião deliberativa da Comissão de Educação para garantir a obrigatoriedade de os entes replicarem os gastos tendo como modelo o que foi feito pelo governo federal até este ano.

Isso porque, num comunicado emitido por servidores do FNDE, eles argumentaram que as mudanças propostas pelo PL 5.695/2019 tornam a alimentação escolar e o transporte escolar políticas de responsabilidade exclusiva dos estados, DF e municípios; assim como também a política de aquisição de livros didáticos e paradidáticos. “No caso do Dinheiro Direto na Escola, está proposta a sua extinção”, diz a nota.

Para eles, uma vez que a compra de livros didáticos seja feita diretamente pelos municípios — hoje eles recebem os livros, mas passarão a receber o dinheiro caso o projeto seja aprovado —, o valor unitário pode subir muito. Isso porque o FNDE negocia a compra em grande escala para distribuição nacional, o que barateia em muito o preço. Outro ponto levantado por eles é o fim do controle fiscalizatório do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Controladoria-Geral da União (CGU) sobre os programas geridos pelo FNDE.

Na reunião da CAE, representantes dos agricultores familiares também expressaram preocupação aos senadores, pois da parcela da União para merendas, 30% precisam ser usados na compra da produção agrícola local. É daí que os alunos recebem a maior parte das frutas e verduras.

Votação

Quatro senadores se abstiveram na votação que aprovou o projeto na CE: Leila Barros (PSB-DF), Paulo Paim (PT-RS), Paulo Rocha (PT-PA) e Fabiano Contarato (Rede-ES). Eles preferiram esperar para ouvir argumentos contrários ao projeto na audiência pública. Paim foi quem sugeriu a audiência pública para que se chegue a consenso antes da votação na CAE. Ele ressaltou que o tema pode ser melhorado com o que for dito na reunião. Já Contarato se manifestou abertamente contrário.

— Esse projeto cobre de um lado e descobre do outro. A educação pública já está sucateada e vilipendiada. Eu tenho vergonha de dizer que R$ 1,2 bilhão acabaram de ser cortados da educação para se pagar parlamentar em troca da aprovação de uma reforma da previdência que vai acabar com os mais pobres — desabafou.

Leila Barros avaliou que faltam garantias de que os projetos e o dinheiro será destinado às necessidades dos alunos e das escolas da maneira como hoje o FNDE faz. Ela preferiu votar apenas depois de ouvir os argumentos na audiência.

— Qual a garantia de que estados e municípios darão continuidade ao que o FNDE faz? Vamos mesmo mexer em programas que estão funcionando?

Distribuição

Criado em 1964, o salário-educação se destina a financiar programas, projetos e ações vinculados à educação básica pública, como merenda, aquisição de livros e transporte escolar. Atualmente, 40% da arrecadação para o salário educação ficam com a União, enquanto 60% são transferidos para os estados e municípios.

A distribuição da verba para as redes estadual e municipais de ensino é feita de maneira uniforme e só leva em conta o número de matrículas. Não pode ser usada para pagamento de pessoal nem é contabilizada para fins de cumprimento dos investimentos mínimos em educação definidos pela Constituição (25% da receita de cada). O dinheiro do salário-educação é usado pelos estados e municípios para consertos nas escolas, despesas gerais, compra de equipamentos, etc.

Mais tarde, no Plenário, Izalci antecipou que parte dos R$ 9,3 bilhões extras precisará pagar bolsas da Capes, financiamento da educação infantil e as mudanças previstas para o Ensino Médio e ensino técnico.

Emenda

Na avaliação do relator, senador Dário Berger (MDB-SC), a aprovação da proposta é muito tranquila, porque não muda a forma de aplicação do dinheiro e mantém os percentuais aplicados em cada programa, de acordo como foi executado em 2019. Ainda num primeiro relatório, ele já havia tirado três artigos do projeto de Izalci, que promoviam alterações na Lei 11.947, de 2009 (merenda), e na Lei 10.880, de 2004 (transporte escolar), além da revogação de dispositivos ligados ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e ao Programa Nacional de Apoio ao Transporte do Escolar (Pnate).

“Entendemos que não cabe ao Poder Legislativo, por meio de lei de sua iniciativa, extinguir ou alterar programas federais existentes ou retirar atribuições de órgão do Executivo. Caberá ao Executivo decidir entre continuar oferecendo os serviços que atualmente são custeados com esses recursos, com outras fontes, ou extingui-los por iniciativa do Presidente da República”, argumentou Dário no parecer.

Com as mudanças promovidas por Dário Berger, o PL 5.695/2019 vai se restringir a modificar dispositivos da Lei 9.424/1996 (Fundeb) e da Lei 9.766/1998 (salário-educação).

No texto aprovado pela CE, em relação ao Fundeb ele determina que o montante arrecadado, após se descontar 1% em favor do INSS, será repassado de forma integral, mensal e automática para as secretarias de educação estaduais e municipais para financiamento dos programas previstos no artigo 208 da Constituição Federal (programas suplementares de material didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde). Com essa verba, estados e municípios passam a financiar programas, projetos e ações da educação básica, incluídos aí, obrigatoriamente, o material didático, o transporte, assistência financeira para as escolas e a merenda escolar, mantidos as diretrizes nacionais e os percentuais aplicados em 2019 em cada programa federal.

Quanto à alteração na lei do salário-educação, a proposta estabelece que o montante do salário-educação devido aos entes subnacionais será distribuído de forma proporcional ao número de alunos matriculados na educação básica pública, considerados fatores de ponderação a serem definidos em regulamentação futura.

PEC do Pacto Federativo

Não é só no projeto de Izalci Lucas que o governo estuda mandar todo o salário-educação para estados e municípios. O tema está sendo discutido na PEC do Pacto Federativo (PEC 188/2019), que pode ser aprovada até meados de 2020. Ela contém várias medidas de descentralização dos recursos da União, uma ideia defendida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, para dar mais flexibilidade para que os entes federativos apliquem o dinheiro arrecadado onde for mais necessário.

Fonte: Agência Senado

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *