O PT retomou a aliança com os socialistas em 2018, quando a candidatura da hoje deputada federal Marília Arraes (PT) foi rifada em prol do apoio dos petistas à reeleição de Paulo Câmara (PSB) e do apoio do PSB à candidatura de Fernando Haddad (PT) para presidente.
O PT de Pernambuco oficializou, na manhã desta quinta-feira (14), sua saída da base do governo de Pernambuco. O partido retomou a aliança com os socialistas em 2018, quando a candidatura da hoje deputada federal Marília Arraes (PT) foi rifada em prol do apoio dos petistas à reeleição de Paulo Câmara (PSB) e do apoio do PSB à candidatura de Fernando Haddad (PT) para a Presidência da República. Com as eleições municipais de 2020 e o lançamento da postulação de Marília no Recife, a pressão para que a sigla entregasse os cargos que possuía no Estado cresceu, culminando, hoje, com o desembarque da Frente Popular.
“Como resultado de debates internos sobre a continuidade da participação do Partido dos Trabalhadores no Governo do Estado, decidimos deixar os cargos que o PT ocupa na atual gestão(PSB-PE). Nossa participação na gestão foi uma decorrência natural da aliança que celebramos com o PSB em 2018 e que teve resultados extremamente positivos para ambos os partidos, entre os quais as reeleições do governador Paulo Câmara no primeiro turno e do senador Humberto Costa, além da significativa contribuição ao desempenho eleitoral de Fernando Haddad no primeiro e segundo turnos das eleições presidenciais”, afirmou o deputado estadual Doriel Barros, presidente estadual do PT, através de nota.
No texto, Doriel informou, ainda, que a decisão pelo rompimento com o PSB se deu não por divergências com a gestão, mas por conta do tratamento “inaceitável, desrespeitoso e incompatível com o histórico de relacionamento” das siglas que o PT recebeu na eleição de 2020. O dirigente se refere ao tom antipetista que o então candidato a prefeito João Campos (PSB) adotou durante a campanha municipal. “Nosso posicionamento não decorre de divergências administrativas com o governo que consideramos estar cumprindo os compromissos celebrados no programa de governo referendado em 2018 pela população pernambucana. É uma consequência política do acirrado enfrentamento eleitoral municipal de 2020, especialmente no Recife, onde recebemos da campanha do PSB tratamento inaceitável, desrespeitoso e incompatível com o histórico de relacionamento de nível elevado entre nossas siglas”, declarou.
Sobre o posicionamento que o partido deve adotar a partir de agora, o deputado federal Carlos Veras (PT) afirmou que a bancada petista na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) deve se tornar “independente”. “Nós faremos oposição com responsabilidade. O PT passa a ter uma bancada independente. O nosso deputado estadual e nossas duas deputadas vão votar de acordo com a orientação do partido e suas consciências políticas. O que for projeto de interesse da população pernambucana, nós vamos votar a favor. Aquilo que não for de interesse da população, que a gente perceber que prejudica a classe trabalhadora, nós seremos contrários”, cravou o parlamentar.
Aliada de primeira hora de Marília Arraes, a deputada estadual Teresa Leitão era uma das principais defensoras do desembarque do PT da base do governador Paulo Câmara (PSB) e da saída dos deputados petistas da bancada de governo da Alepe. A parlamentar saudou a decisão da Executiva Estadual. Para a deputada, a permanência no governo estadual tornou-se “insuportável e constrangedora” diante da forma como a candidatura do PSB no Recife se utilizou do antipetismo na eleição do ano passado, ainda que a aliança entre os dois partidos no âmbito estadual tenha sido forjada anteriormente na eleição de 2018.
“Saúdo também a orientação para um reposicionamento da bancada do PT na Assembleia Legislativa, onde continuaremos a defender os interesses do povo pernambucano sem amarras governamentais. Apesar de ter me posicionado publicamente favorável às decisões hoje assumidas pela instância estadual, tão logo se encerrou o ciclo eleitoral, aquelas eram posições individuais e de grupo. Agora são posições reforçadas pela devida instância partidária, a serem respeitadas e encaminhadas pelos filiados e filiadas do PT”, afirmou a petista.
A deputada federal Marília Arraes e a deputada estadual Dulcicleide Amorim (PT) foram procuradas para comentar o tema, mas preferiram não se pronunciar. O senador Humberto Costa não responderam às tentativas de contato do JC.
Na visão de Ernani Carvalho, cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), o movimento do PT consolida mudanças partidárias internas que começaram a se desenhar ainda em 2020, quando Marília enfrentou a resistência que sofria na cúpula pernambucana da agremiação e conseguiu garantir a sua candidatura a prefeita junto à nacional. “Creio que Marília Arraes sai fortalecida desse processo, ela disputou a prefeitura em detrimento da força do senador Humberto Costa, que perde um pouco do prestígio na liderança do partido no Estado, tendo em vista que ele era um dos grandes fiadores da aliança do PT com PSB. Isso abrirá um novo jogo de xadrez para a sucessão em 2022 em Pernambuco. O PSB precisará fazer bastante força para manter o Estado em suas mãos”, observou o analista.
A respeito da postura de “independência” que a legenda afirmou que adotará na Alepe, Vanuccio Pimentel, cientista político da Asces/Unita, afirmou que ela se configura mais como uma falta de opção para o PT do que propriamente como uma marca ideológica ou política. “Aparentemente não há um rompimento político entre petistas e socialistas, há uma discordância grave com relação à eleição do Recife, o que fará com que os deputados do PT fiquem neutros. Se a sigla partisse para a oposição, automaticamente ficaria isolada, porque os demais atores desse grupo são da centro-direita, como o DEM e PSDB, por exemplo. Não é interessante para o PT tomar a posição de oposição aberta”, pontuou.
Questionado se o desembarque petista dá alguma pista a respeito dos rumos que o partido deve adotar em Pernambuco em 2022, Pimentel diz que ainda é cedo para fazer projeções neste sentido. “A gente não sabe ainda qual será a dinâmica da eleição nacional, e ela deve ditar muito do que vai ocorrer no restante do País. Eu digo isso porque a depender da posição do PT nacional, por exemplo, se a sigla vai ou não lançar candidato próprio, todas as candidaturas estaduais passariam a trabalhar em cima disso”, detalhou o docente. Vale lembrar, no entanto, que ao menos nos últimos 20 anos o PT sempre lançou candidatura própria ao governo estadual quando não esteve coligado com o PSB. A única exceção é 2014, quando o partido apoiou a postulação de Armando Monteiro (então no PTB, hoje sem partido) ao Palácio do Campo das Princesas.
A cientista política Priscila Lapa, da Faculdade de Ciências Humanas de Olinda (Facho), projeta que, provavelmente, o PT deve lançar um candidato a governador em 2022, mas ressalta que dificilmente o partido terá unidade na escolha do nome que vai encabeçar essa chapa. “A escolha de um candidato no PT não foi consenso em 2018, não foi em 2020 e com a derrota que Marília sofreu, continua não sendo. Marília se fortaleceu? Sim. Ela tem força, tem voto, tem capital político, mas ao mesmo tempo Humberto Costa tem um mandato de senador. Não é simples para o PT resolver essa equação”, considerou Priscila.
Confira abaixo a nota do PT-PE na íntegra:
Como resultado de debates internos sobre a continuidade da participação do Partido dos Trabalhadores no Governo do Estado, decidimos deixar os cargos que o PT ocupa na atual gestão(PSB-PE).
Nossa participação na gestão foi uma decorrência natural da aliança que celebramos com o PSB em 2018 e que teve resultados extremamente positivos para ambos os partidos, entre os quais as reeleições do governador Paulo Câmara no primeiro turno e do senador Humberto Costa, além da significativa contribuição ao desempenho eleitoral de Fernando Haddad no primeiro e segundo turnos das eleições presidenciais.
Ao longo desses dois anos, o PT contribuiu de forma decisiva para o sucesso da administração estadual, desenvolvendo políticas públicas com criatividade, competência e compromisso com a maioria da população, especialmente no segmento da agricultura familiar. Implantamos um trabalho que, se continuado, permitirá a colheita de importantes frutos para a gestão estadual e mudanças estruturais nesses setores.
Nosso posicionamento não decorre de divergências administrativas com o governo que consideramos estar cumprindo os compromissos celebrados no programa de governo referendado em 2018 pela população pernambucana. É uma consequência política do acirrado enfrentamento eleitoral municipal de 2020, especialmente no Recife, onde recebemos da campanha do PSB tratamento inaceitável, desrespeitoso e incompatível com o histórico de relacionamento de nível elevado entre nossas siglas.
Decorre também da posição da direção nacional do PT que não produziu nenhuma manifestação pública ou reservada que demonstrasse o interesse em preservar nossa participação no governo como espaço facilitador de conversas entre as duas siglas em nível nacional.
A partir de agora, assumimos um posicionamento de independência em relação ao governo estadual que pautará também a nossa conduta na Assembleia Legislativa de Pernambuco.
Esperamos ainda a continuidade de um diálogo respeitoso com o governo estadual e com a própria Frente Popular.
Recife, 14 de janeiro de 2021.
Doriel Barros
Presidente do Partido dos Trabalhadores de Pernambuco.
JC