PEC da Transição: CCJ do Senado aprova texto com ampliação do teto em R$ 145 bilhões e possibilidade de gasto extra para investimentos

Os senadores Davi Alcolumbre, Fernando Bezerra Coelho e Alexandre Silveira em sessão na CCJ do Senado Federal (Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado)

Os integrantes da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal aprovaram, nesta terça-feira (6), parecer da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição. O texto, sob relatoria do senador Alexandre Silveira (PSD-MG), recebeu apoio unânime dos parlamentares em votação simbólica.

Com isso, a PEC, aposta do governo eleito para abrir espaço orçamentário e garantir o pagamento do Bolsa Família (que será retomado no lugar do Auxílio Brasil) “turbinado” e outras promessas de campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), segue para análise do plenário, onde precisa do apoio de pelo menos 3/5 (ou seja, 49 dos 81 senadores) em dois turnos de votação.

A expectativa é que as duas votações em plenário ocorram na quarta-feira (7). Para isso, será necessário um acordo entre os parlamentares para a quebra dos prazos previstos no regimento interno da casa legislativa. Nos bastidores, parlamentares tentam viabilizar a votação ainda nesta noite.

O governo eleito corre contra o tempo para aprovar a matéria. Uma vez aprovada pelo Senado Federal, a PEC ainda precisa ser analisada pela Câmara dos Deputados, também com necessidade de apoio de 3/5 (ou seja, 308) em dois turnos de votação. As duas casas precisam votar o mesmo texto para que ele seja promulgado. Restam 16 dias para o início do recesso parlamentar.

O resultado ocorre após ajustes no texto por parte do relator, em meio a resistências de parlamentares quanto ao espaço fiscal concedido ao governo eleito fora do teto de gastos – a regra fiscal que limita o crescimento de despesas públicas em um exercício ao comportamento da inflação no ano anterior.

Inicialmente, o governo eleito pedia um “waiver” (ou seja, uma licença para gastar) além do teto de gastos de R$ 198 bilhões, sendo R$ 175 bilhões apenas para o Bolsa Família. A ideia era retirar das limitações da regra fiscal os R$ 105 bilhões já previstos no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), que garantiria o pagamento de R$ 400,00 no Auxílio Brasil.

Ao montante seriam acrescidos R$ 70 bilhões para viabilizar a manutenção das parcelas mensais nos atuais R$ 600,00 e o pagamento adicional de R$ 150,00 a famílias com crianças de até seis anos.

parlamentares, Silveira apresentou outras três novidades em seu relatório. A primeira exclui do escopo de incidência do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCDM) as doações destinadas, no âmbito do Poder Executivo da União, a projetos socioambientalistas ou aos destinados a mitigar os efeitos das mudanças climáticas, e às instituições federais de ensino (IFEs).

Outra mudança foi a retirada das restrições impostas pelo teto de gastos de despesas da Fundação Oswaldo Cruz custeadas por receitas próprias.

O terceiro ponto foi a inclusão do programa Gás dos Brasileiros no “waiver” fiscal (ou seja, na licença para gastar). Desta forma, não será preciso observar, em 2023, as limitações legais quanto à criação, expansão ou aperfeiçoamento da ação governamental, inclusive quanto à necessidade de compensação.

Negociações

A aprovação veio depois de acordo proposto pelo senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) de reduzir a expansão do teto em R$ 30 bilhões. Apesar do entendimento, o parlamentar informou que apresentará em plenário emenda para tentar reduzir o prazo de validade da regra de dois para um ano e que ainda tentará reduzir a expansão do teto.

Parlamentares apresentaram novas emendas durante os trabalhos da CCJ. Ao todo, 52  sugestões de alterações foram protocoladas. A reunião, iniciada às 10h34, chegou a ser suspensa por mais de três horas para o relator analisá-las e novos pontos foram negociados entre os senadores na busca de um texto de consenso.

Os principais pontos de divergência, segundo o senador Jaques Wagner (PT-BA), estariam no prazo da PEC, na data de envio do novo marco fiscal e na redução do impacto da proposta em R$ 30 bilhões.

Parte dos senadores sugeriu que a expansão dos gastos para o pagamento valesse apenas por um ano e cobraram que a proposta de um novo marco fiscal para substituir o teto de gastos seja encaminhado em seis meses após o início do novo governo.

O ponto mais sensível, segundo Wagner, e que seguirá em discussão no plenário, é a redução do prazo de dois anos para um ano do valor definido para os programas sociais.

“Se eu dou um, eu estou premido; se não conseguirmos votar o novo arcabouço fiscal, eu vou ter que fazer alguma coisa para manter o orçamento do Bolsa Família. Na verdade, o segundo ano, eu diria, é um seguro; não é uma folga para não votar o novo arcabouço fiscal”, afirmou.

Senadores se queixaram do curto prazo para análise da matéria. Líder do governo no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ) afirmou que é favorável à manutenção do pagamento dos R$ 600 no próximo ano, mas pediu um prazo maior para de discussão da matéria. O parlamentar apresentou um requerimento para realização de uma audiência pública para debater a PEC, mas o pedido foi rejeitado pela CCJ.

“O próprio governo concorda com a valor de R$ 600 do Auxílio Brasil, mas a gente tem outras questões que não podemos, com todo respeito, passar no atropelo. O relatório entrou agora; quando deu quórum, entrou o relatório; 20 páginas; é um tema complexo. E foi alterado. Agora, é necessário que a gente tenha o prazo para a gente poder avalizar”, disse.

Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro (PL),  reforçou o pedido de adiamento da votação e disse que o consenso se limitaria aos R$ 600,00. Ele afirmou que a manutenção do benefício poderia ser feita por meio da edição de uma medida provisória e criticou a “correria” para votação.

“Essa correria, no meu ponto de vista pelo menos, gera, sim, uma incerteza, gera uma instabilidade, gera uma imprevisibilidade. O presidente [Jair] Bolsonaro pode, por exemplo, editar uma medida provisória e garantir os R$ 600,00, desde que não haja óbices no tocante a possíveis crimes de responsabilidade. Está resolvida a questão. […] A gente não sabe nem quem é o ministro da Economia que vai tomar conta disso”, disse.

Relator do Orçamento e primeiro signatário da PEC, Marcelo Castro (MDB-PI) afirmou que a mudança no teto de gastos é fundamental para garantir o mínimo para o país funcionar em 2023. “Não se está querendo fazer uma gastança desenfreada nem cometer irresponsabilidade fiscal. É o mínimo necessário e indispensável para o país funcionar”, disse.

Integrante da equipe de transição do governo eleito, a senadora Simone Tebet (MDB-MS), que disputou a Presidência da República nas últimas eleições e apoiou Lula no segundo turno, reforçou que a mudança no teto de gastos é urgente.

“A crise está aí e ela não é só do Bolsa Família. Eu estou no grupo da transição. Só do Bolsa Família, são R$ 175 bilhões, mas temos R$ 2 bilhões do gás. Se nós não abrirmos um crédito, não teremos R$ 2 bilhões do gás. Se nós não abrirmos um crédito de R$ 3 bilhões para o Suas, não vai ter dinheiro para os municípios garantirem os Cras [Centros de Referência de Assistência Social] na assistência social”, apontou.

Apesar de ser favorável à manutenção dos programas sociais, Tasso Jereissati (PSDB-CE) alertou durante a reunião que a manutenção do valor de R$ 175 bilhões pode trazer riscos para a economia. O senador é autor de uma proposta alternativa à PEC da Transição, com liberação de R$ 80 bilhões de espaço fiscal sobre o teto de gastos.

“Se esse número de R$ 175 bilhões prevalecer, eu posso escrever aqui que nós estaremos, dentro de dois anos, vivendo juros reais de cerca de 9% — a perspectiva é de 9% reais. E isso é o maior afugentador de investimento, e investimento é o que gera emprego. Ao mesmo tempo, a inflação deve estar em altíssimos patamares também”, alertou.

(com Agência Senado)

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