É uma reação mais do que esperada, porque é a mesma de sempre, a cada medida ou intenção que o governo anuncia ao público — irada, indignada e automática.
Mas, ainda assim, pareceu particularmente enfurecido o grito de “escândalo” que acompanhou o recente projeto de ajuda financeira aos caminhoneiros, proposto pelo governo para amenizar a pancada que a alta nos preços dos combustíveis tem sido para o setor.
Como fazer uma coisa dessas num ano eleitoral? Isso é compra de votos. É antidemocrático. Pode influir no resultado da eleição. A chapa do presidente da República na eleição de outubro tem de ser cassada — e por aí vamos.
Pior ainda: numa súbita e inesperada empolgação com a austeridade nos gastos públicos, acusou-se o governo de aumentar a despesa do Erário e arruinar com isso as contas nacionais.
Ficou engraçado, porque no mesmo momento em que desabava essa tormenta de inconformismo e de ressentimento quanto aos caminhoneiros, o Congresso aprovava, em festas, uma doação de R$ 7 bilhões aos artistas — e não houve a mais remota tentativa, por parte de ninguém, de sugerir que haja alguma coisa errada nisso.
Bolsonaro tinha vetado as leis que faziam esse presente; os parlamentares derrubaram o veto presidencial, e daí o presente ficou valendo. Como assim? Não é, nos dois casos, dinheiro igual, tirado do pagador de impostos? Não afeta, do mesmo jeito, as contas do governo? Sim e sim. Então por que a indignação num caso e o aplauso no outro? Fica a impressão de que caminhoneiro é uma coisa, ruim, e que artista é outra, boa. Para o primeiro não pode haver ajuda do Tesouro Nacional. Para o segundo pode. Não faz nexo nenhum.
É complicado dizer que o ajutório aos artistas sai “mais barato”, por que 7 bilhões é dinheiro — e se estão todos tão preocupados assim com os princípios gerais de rigor na gestão do gasto público, não dá para dizer em que número, exatamente, começa a irresponsabilidade. Seria certo, então, estourar as contas até uma certa cifra? Qual? Estouro em favor da “cultura” é permitido? Estouro em favor do transporte de mercadorias é proibido? É essa a qualidade do debate econômico e político no Brasil de hoje. O ex-presidente Lula, candidato que já está nomeando seus ministros, diz que vai acabar com o teto dos gastos públicos — é, aliás, uma das suas promessas de campanha mais furiosas. É algo considerado perfeitamente normal. Revista Oeste