A Câmara dos Deputados decidiu na noite desta quarta-feira manter a prisão do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), acusado de ser o mandante do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. A votação passou por uma margem apertada. Foram 277 votos favoráveis a prisão, 129 contrários e 28 abstenções. Eram necessários 257 votos para manter Chiquinho na prisão.
Associado à milícia por investigadores, o parlamentar foi derrotado pelos colegas em plenário, mas conseguiu angariar apoio expressivo de partidos do Centrão e da oposição.
Deputados do União Brasil, PL, Republicanos e PP agiram para esvaziar a sessão de hoje e tentar impedir que a prisão tivesse os votos mínimos para ser mantida.
Em um dia marcado pela incerteza, parlamentares contrários à decisão da Casa apelaram ao espírito de corpo e a questões técnicas para se manifestar. O principal argumento foi a possibilidade de outros deputados ficarem vulneráveis à possibilidade de prisão preventiva.
O embate entre o Judiciário e apoiadores de Jair Bolsonaro também contribuiu para elevar as tensões e influenciou os debates. O assunto foi analisado mais cedo pela Comissão de Constitução e Justiça (CCJ). No colegiado, foram 39 votos a favor da prisão e 25 pela soltura.
O bloco composto por União Brasil, PP, PDT, PSDB e Cidadania e o que contém PSD, MDB, Republicanos e Podemos liberaram as bancadas. A federação do PT, PCdoB e PV, a federação PSOL e Rede, o PSB e o Solidariedade pediram a manutenção da prisão.
– Demos um passo importante em direção à elucidação do caso. A soltura do Brazao traria obstruções ao processo. Enfrentamos o poder das milícias e o rito sumário do Lira – disse o deputado Chico Alencar após o resultado (PSOL-RJ).
Antes da votação, o líder do PL, Altineu Cortês (PL-RJ), reclamou da decisão do STF. O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que está no exterior, filho ’03’ do ex-presidente Jair Bolsonaro, gravou um vídeo pedindo que os deputados da oposição votassem contra a prisão.
– Nós juramos a Constituição quando assumimos o mandato e no nosso entendimento essa prisão é ilegal e fere a Constituição – disse Altineu.
No plenário, o advogado de Chiquinho Brazão, Cléber Lopes, contestou a avaliação da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que havia votado contra Brazão, e a manutenção da prisão do parlamentar. Ele disse que Brazão vem sendo exposto a uma “tortura psicológica”.
— Um deputado desta Casa foi surpreendido em sua residência por uma ordem do STF e trazido para Brasília algemado e exposto como um troféu. Agora ele está submetido a um regime disciplinar diferenciado, com 23 horas de cárcere por dia. Esta prisão extrapola os limites da dignidade da pessoa humana. Com todo respeito à maioria da CCJ, houve uma decisão alicerçada em considerações de mérito e eventual culpabilidade do parlamentar. Vale lembrar que a prisão do meu cliente é alicerçada em uma delação premiada — afirmou.
— Estamos vivendo a barbárie e a tortura psicológica do parlamentar. A Câmara precisa entender que não está julgando o parlamentar ou escrutinando as provas. Estamos aqui julgando se a Constituição Federal autoriza a prisão do parlamentar. Esta não é uma prisão em flagrante, é bom lembrar. Pretendeu-se construir na CCJ a ideia de que houve um crime em flagrante, mas isto não há. É uma prisão preventiva ao arrepio à Constituição Federal. Estive com o deputado no presídio e ele jura inocência. O relatório da Polícia Federal é teatral e frustrante — completou.
Chiquinho e seu irmão Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, foram presos no dia 24 de março. Apesar do placar favorável para a manutenção da prisão, deputados do Centrão ficaram incomodados. O entendimento é que a decisão do STF pode abrir precedentes para que outros deputados sejam punidos.
O líder do União Brasil, Elmar Nascimento (BA), disse ser contra a decisão do Supremo. O entendimento é compartilhado pela maioria da bancada da sigla, que é a terceira maior da Casa. Deputados do PP e do Republicanos, partido que chegou a abrir negociação para filiar Brazão, também abrigam deputados insatisfeitos com a prisão.
Durante todo o dia de hoje, a deputada Dani Cunha (União-RJ), filha do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, esteve reunida com aliados. Ela e o pai são do mesmo grupo político que a família Brazão no Rio. A deputada esteve em contato permanente com o líder do União Brasil, Elmar Nascimento (BA), ontem e hoje. O parlamentar também se manifestou contrário à prisão de Chiquinho.
Antes da votação em plenário, ela também manteve conversas com deputados como Áureo Ribeiro (Solidariedade-RJ), Luciano Vieira (PL-RJ) e Juninho do Pneu (União-RJ), todos da bancada do Rio e do mesmo grupo dos Brazão.
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), orientou para que a prisão fosse mantida. Ele também trabalhou junto aos parlamentares da base para evitar ausências que poderiam salvar Chiquinho. Antes da votação, a expectativa de Guimarães e do relator Darci de Matos era a de que era possível manter a prisão, mas que o placar seria apertado.
Por outro lado, o presidente da Embratur, Marcelo Freixo, que era próximo de Marielle, acompanhou a votação. O ex-deputado, que é filiado ao PT do Rio de Janeiro, participou da articulação para que a prisão de Chiquinho fosse mantida. Ele conversou com o presidente do PSD, Gilberto Kassab, e com o senador Renan Calheiros (MDB-AL) para que os deputados de seus partidos participassem da votação e votassem para manter a decisão do STF.
— Quem votou pela manutenção da prisão, votou pelo respeito à família de Marielle e demonstrou vontade de ver todos os detalhes respondidos. Quem votou contra, está contra o rito legal — declarou Freixo.
Ao determinar a prisão, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que eles fossem conduzidos a uma unidade federal. Além dos irmãos, o ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro Rivaldo Barbosa também foi preso.
Barbosa está preso em Brasília. Já Chiquinho está em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, e Domingos em Porto Velho, em Rondônia, para evitar que mantenham contato.
O Globo