Marconi França, transportador autônomo de Pernambuco que está liderando uma convocação de greve de caminhoneiros a partir das 6h desta segunda-feira (16), reafirmou neste domingo (15) que o movimento está mantido.
Em vídeo que circula em grupos de Whatsapp, França afirma que a greve ocorrerá com a adesão seus seguidores, mas afirmou que vai renunciar ao apoio que vem recebendo da Central Única dos Trabalhadores (CUT) do Rio de Janeiro.
A proximidade entre França e a CUT fez com que outros líderes de caminhoneiros o acusasse de estar politizando o movimento numa hora em que a greve não é bem vista por muitos de seus colegas, pela proximidade do Natal e uma ainda frágil retomada da economia.
O ministro de Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, também entrou na discussão e disse ao Valor que “greve de caminhoneiros é defendida por pessoas com interesse político”, numa alusão ao apoio da CUT a França.
Mas embora haja divisão na adesão à greve, cresce o descontentamento por parte da classe, que apoiou em massa a eleição do presidente Jair Bolsonaro (PSL), com a baixa velocidade das ações tomadas pelo governo até agora para atender às pautas da categoria. O burburinho nos grupos de caminhoneiros no WhatsApp, e mesmo o desencontro de informações entre lideranças, remete muito ao clima no período anterior a maio de 2018.
Representantes de caminhoneiros que, no início da semana, negavam categoricamente se juntar ao movimento grevista já não descartam uma paralisação mais à frente, caso o Executivo não avance na agenda. Também é crescente o tom das discussões e as tensões nos grupos de WhatsApp — o meio de comunicação mais usado pelos transportadores autônomos para debaterem suas reivindicações e catalisador das mobilizações que levaram à greve de maio de 2018, que parou o país. Mais do que representantes sindicais, as lideranças que ascendem de forma espontânea nessas plataformas acabam ganhando visibilidade a partir de contatos políticos ou organizações civis.
As reivindicações incluem mudanças na política de reajuste do diesel praticada pela Petrobras; cumprimento do piso mínimo do frete, com fiscalização intensiva pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e aplicação de multas a quem o descumprir; publicação da resolução do Código Identificador da Operação de Transportes (Ciot), um dispositivo eletrônico que auxilia no cumprimento do piso; e redução nos preços do gás de cozinha e da gasolina.
Na terça-feira e ontem, representantes de entidades e cooperativas de caminhoneiros da Baixada Santista circulavam diferentes vídeos em que, reunidos, pronunciavam-se contra uma paralisação na próxima segunda-feira. Mas o diretor do Sindicato dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens da Baixada Santista e Vale do Ribeira (Sindicam), José Cícero Rodrigues, admitiu que, se o governo não apresentar propostas que efetivamente atendam, ao menos em parte, os anseios da categoria manifestados há mais de um ano — e que motivaram a greve de 2018 —, Santos pode até vir a liderar um movimento grevista em 2020.
“Aí, sim, pode ser que Santos venha a puxar uma paralisação junto com outros Estados, para satisfazer a vontade dos caminhoneiros que aguardaram tanto tempo essa resposta do nosso presidente. Na campanha, ele sinalizou que poderia ajudar os caminhoneiros, e até agora não deu essa posição”, observou Rodrigues.
Ele disse ainda que procurou Marconi para expor que não considera o momento ideal para uma greve, tendo em vista as festas de fim de ano. “Para esse ano nossa posição é de não paralisar. Foi o que falei com o Marconi, desejei boa sorte a ele. Minha conversa foi essa”, contou o sindicalista, que não avançou na comunicação com o colega.
Para Rodrigues, é igualmente um equívoco o envolvimento da Central Única dos Trabalhadores (CUT) com a causa, segundo ele uma aliança que contraria a posição da categoria, que promoveu até carreata para eleger Bolsonaro. A convocação de greve foi feita por França num vídeo, segundo ele gravado na sede da CUT-RJ. Hoje ele voltou a afirmar que a greve está confirmada e que agora conta com apoio de mais quatro centrais.
O movimento também ganhou força no sul do país. Presidente do Sindicato dos Transportadores Autônomos de Carga (Sinditac) de Ijuí (RS), José Taschetto Cecchetto confirmou orientação da entidade, dirigida a seus 19 mil associados de 158 municípios, para paralisação na segunda-feira. “O governo não está cumprindo as promessas que fez, está empurrando as ações para a frente”, reclamou ele ao Valor.
Questionado sobre a divisão da categoria quanto à decisão de parar, Cecchetto argumentou que era exatamente esse o cenário ante da greve de maio de 2018. “Aham… É assim que começa. Quando você se dá conta, acontece. A greve pega no país.”
Procurado pelo Valor, o Ministério da Infraestrutura retornou que mantém diálogo contínuo, com reuniões bimestrais, com as entidades representativas de embarcadores, transportadores e caminhoneiros autônomos.
“Na última reunião do Fórum, em 5 de dezembro, foram discutidos temas como: o fortalecimento do cooperativismo, a criação do cartão combustível, o programa de saúde para os caminhoneiros e a inclusão dos pontos de parada e descanso como uma obrigatoriedade nos processos de concessão de rodovias federais”, informou o ministério, em nota.
O órgão também respondeu sobre o cronograma do Ciot. “Ao longo do ano, uma série de medidas foi tomada e uma delas é a resolução que vai tratar do Código Identificador da Operação de Transporte — Ciot. A resolução provavelmente sairá na próxima semana.”
Valor Econômico