A atriz Regina Duarte anunciou nesta quarta-feira, 20, que está de saída da Secretaria da Cultura do governo de Jair Bolsonaro. Em um vídeo ao lado do presidente e que foi postado por ele no Twitter, Regina disse que assumirá o controle da Cinemateca, em São Paulo, por sentir falta da família.
No vídeo, Regina afirma que foi ao encontro de Bolsonaro no Palácio da Alvorada para perguntar se estava sendo “fritada” por ele. Desde o início de sua gestão, a atriz vinha sofrendo ataques da ala ideológica do governo que é ligada ao polemista Olavo de Carvalho, guru da família presidencial.
“Toda semana tem um ou dois ministros que, segundo a mídia, estão sendo fritados. O objetivo é desestabilizar a gente e tentar jogar o governo no chão. Jamais vou fritar você”, disse Bolsonaro no vídeo. O presidente, no entanto, havia dado autorização para que integrantes de sua administração atacassem a agora ex-secretária. Foi por isso que desafetos de Regina como o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, subiram o tom contra a gestão da atriz na pasta da Cultura.
No encontro com Bolsonaro, Regina estava acompanhada da deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP), de quem é amiga e que tentava há tempos costurar uma saída honrosa para a atriz do governo. Ainda no vídeo, Regina declarou que havia ganhado “um presente” ao assumir a Cinemateca. “É um sonho de qualquer pessoa de comunicação, de audiovisual, de cinema e de teatro”, disse. “É um presente duplo. É a Cinemateca e também estar próxima da minha família, que é algo que eu estou desejando muito.”
O favorito para assumir a Secretaria de Cultura é o ator Mário Frias, que almoçou na terça-feira, 19, com Bolsonaro e o filho Zero Um do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). Eles participaram juntos de um encontro com os presidentes de Flamengo e Vasco para discutir a volta dos campeonatos de futebol em meio à pandemia do novo coronavírus. Quando Regina ainda estava no cargo, Bolsonaro compartilhou nas redes sociais um vídeo de uma entrevista em que Frias se colocava à disposição para chefiar a pasta.
Uma Novela Trágica
Regina Duarte foi convidada para ser a quarta secretária da Cultura do governo Bolsonaro depois da demissão do dramaturgo Roberto Alvim, que plagiou um discurso do ministro nazista Joseph Goebbels ao anunciar um prêmio para as artes. A atriz abriu mão de um lucrativo contrato com a Rede Globo, onde trabalhou por 50 anos, para embarcar na administração federal. Ela levou semanas para assumir o cargo de forma oficial, no dia 4 de março, mas nunca conseguiu sequer montar uma equipe de trabalho.
Com apoio do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), o núcleo ideológico do governo atuou para sabotar a administração de Regina Duarte. O presidente Bolsonaro, que havia prometido carta branca para a atriz trabalhar, vetou em diversas ocasiões os nomes que ela tentava emplacar na secretaria. Segundo os olavistas do governo, Regina estava tentando contratar pessoas “de esquerda” para assumir posições estratégicas na pasta.
O fim da passagem de Regina pelo governo começou a se desenhar no início do mês, quando o maestro olavista Dante Mantovani foi reconduzido para a diretoria da Funarte sem que ela fosse consultada. Mantovani foi o primeiro funcionário que a atriz demitiu ao assumir a secretaria. Horas depois, Bolsonaro revogou a recondução do maestro e deixou no comando interino da Funarte um ex-assessor de Carlos Bolsonaro.
O presidente também reclamava que Regina estava trabalhando de São Paulo, onde escolheu cumprir a quarentena do coronavírus. Após o imbróglio com Mantovani, a atriz foi se encontrar com o presidente em Brasília para apresentar um plano de trabalho, mas foi surpreendida ao ver o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, se sentar ao lado de Bolsonaro para acompanhar a reunião. Camargo era o maior desafeto de Regina neste governo. A atriz tentou demiti-lo assim que assumiu o cargo, mas foi desautorizada por Bolsonaro.
A gestão de Regina Duarte chega ao fim sem que nenhuma medida em prol do setor cultural tenha sido anunciada por ela. A atriz vinha sofrendo duras críticas de artistas e ex-colegas de trabalho por ter negligenciado os impactos que a crise do coronavírus trouxe para quem trabalha com as artes no Brasil.
Na última entrevista que concedeu, ao canal de televisão CNN Brasil, Regina deveria comunicar quais eram os programas que estava elaborando para o setor, mas acabou provocando o repúdio da classe artística ao minimizar torturas e mortes durante a ditadura militar.
(Veja)