A Polícia Federal não paga pelos serviços prestados pela empresa Dígitro, detentora do sistema “Guardião”, desde abril de 2016. Os repasses à companhia catarinense fazem parte do contrato firmado entre as partes em 2010 para interceptações telefônicas e de dados a partir de autorização da Justiça nas investigações em curso, incluindo a Operação Lava-Jato.
O último pagamento da PF à empresa ocorreu em 3 de agosto de 2016 e se refere aos serviços prestados entre 1º e 18 de abril do mesmo ano. O valor repassado chegou a R$ 189.286,92 e diz respeito ao suporte técnico prestado nas superintendências regionais e unidades em Maceió, Macapá, Salvador, Fortaleza, Brasília, Campo Grande, Curitiba, Belém, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Florianópolis, São Paulo e Belo Horizonte. Os contratos não foram renovados.
Os repasses referentes aos servidores prestados em dezembro de 2015, janeiro, fevereiro e março de 2016 só foram pagos entre 6 e 15 de junho do ano passado. Além disso, em dezembro de 2016, a PF cancelou o empenho de R$ 2,6 milhões previsto para o pagamento das despesas com a Dígitro, sob o argumento de que seria feito um ajuste orçamentário.
Procurada, a PF informou que os dados são classificados como secretos pelo Ministério da Justiça e por isso não poderia comentar o assunto. O departamento, entretanto, garante que não há qualquer interrupção ou prejuízo às investigações em curso.
Em nota, a Dígitro detalhou que contratos relativos ao sistema Guardião possuem cláusulas de confidencialidade e não se manifestaria sobre o tema. Entretanto, investigadores ouvidos pelo Correio apontam que sem o pagamento das faturas do “Guardião”, as interceptações não estão sendo repassadas à PF e isso poderia prejudicar as operações em curso. Para piorar, a polícia não teria um backup dos conteúdos interceptados, que estariam armazenados na sede da empresa.
Riscos
Um dos investigadores explicou à reportagem que a PF discutia internamente os riscos de manter um contrato com uma empresa privada para interceptações telefônicas e com isso abrir uma porta para possíveis invasões de hackers. Diante da suspensão dos serviços, a PF tenta migrar as interceptações para um novo programa, conhecido como Sistema de Interceptações de Sinais (SIS), que ainda não está em pleno funcionamento, segundo os investigadores. Policiais a par do assunto detalharam que o sistema só entraria em funcionamento após o carnaval, mas ainda seria necessário realizar diversos ajustes até que a ferramenta funcione plenamente.
Internamente, investigadores criticam a falta de planejamento da diretoria da PF para o problema e detalham que o SIS levará tempo para estar em operação. Enquanto o impasse não é resolvido, os policiais usam outro sistema de grampo, conhecido como Bedin.
As interceptações realizadas pela PF só podem ocorrer com autorização da Justiça. O Judiciário concede vista ao Ministério Público Federal (MPF), para que se manifeste a respeito do pedido. Se o pedido é deferido, o magistrado encaminha um mandado judicial para notificar a operadora de telefonia ou o provedor para cumprir a decisão. Após esse processo, os investigadores enviam um ofício complementar com informações técnicas para onde serão enviados os dados interceptados.
As ligações e mensagens grampeadas são encaminhadas ao “Guardião” que está instalado nos servidores da PF. O sistema monitora e analisa os dados enviados pelas operadoras de telefonia e pelos provedores. Além disso, auxilia no levantamento de provas por meio do cruzamento de informações. Após o encerramento do prazo autorizado pelo Judiciário para as interceptações, a operadora interrompe o envio de dados ao “Guardião”.
Após esse processo, a PF encaminha à Justiça o relatório das investigações com as provas. Se novos grampos forem necessários, todo o processo deve ser repetido.
Correio Braziliense.