O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar nesta quarta-feira para anular a votação, na Câmara dos Deputados, do pacote anticorrupção e, por consequência, da emenda que definiu o abuso de autoridade para juízes e integrantes do Ministério Público. Segundo o magistrado, a votação do tema foi permeada por ilegalidades. Na prática, a decisão de Fux impõe que o tema volte à estaca zero na Câmara dos Deputados e exige que o projeto mantenha o teor original proposto pelo Ministério Público e apoiado em massa pela população. Na noite desta quarta-feira, diante da falta de apoio explícito de senadores, o presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL) retirou de pauta outro projeto que tratava de abuso de autoridade, e a proposta passará a ser discutida na Comissão de Constituição e Justiça da Casa no ano que vem.
No mandado de segurança analisado por Fux, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSC-SP), autor do recurso, alegava que, por dizer respeito do Poder Judiciário e ao Ministério Público, a iniciativa legislativa teria de ser do Supremo Tribunal Federal, e não do Congresso. Na madrugada de 30 de novembro, o plenário da Câmara aprovou emenda ao pacote anticorrupção e elencou a responsabilidade de juízes a magistrados que ajam, por exemplo, com má-fé nos processos, com intenção de promoção pessoal ou com o objetivo de perseguição política. A proposta aprovada na Câmara a partir de uma emenda que desfigurou o projeto original estabelece que essas autoridades podem sofrer sanções no caso de “expressar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento” ou promover a “instauração de procedimento sem que existam indícios mínimos de prática de algum delito”.
Pelo texto, será responsabilizado “quem ajuíza ação civil pública e de improbidade temerárias, com má-fé, manifesta intenção de promoção pessoa ou visando perseguição política”. Como é controversa a aferição se um magistrado ou procurador, por exemplo, agiu com má-fé ou temeridade, o juiz Sergio Moro sugeriu ao Senado que fosse incorporado à lei trecho que estabelece que “não configura crime previsto nesta lei a divergência na interpretação da lei penal ou processual penal ou na avaliação de fatos e provas”.
No mandado de segurança apresentado ao Supremo, o deputado Eduardo Bolsonaro alegou que “não cabe ao Poder Legislativo a formulação de proposições que versam sobre o exercício da Magistratura e dos Membros do Ministério Público, sob pena de ferir as normas constitucionais de iniciativa legislativa”. De acordo com Bolsonaro, a aprovação da emenda sobre abuso de autoridade extrapolou o escopo do projeto anticorrupção, que teve iniciativa popular.
Em sua decisão, o ministro do STF Luiz Fux disse que não é possível desfigurar um projeto de iniciativa popular desta maneira, como ocorreu com o pacote anticorrupção, que teve 2.028.263 assinaturas. “Que o projeto de iniciativa popular seja debatido em sua essência, interditando-se emendas e substitutivos que desfigurem a proposta original para simular apoio público a um texto essencialmente distinto do subscrito por milhões de eleitores”, disse o magistrado.
“Há apenas simulacro de participação popular quando as assinaturas de parcela significativa do eleitorado nacional são substituídas pela de alguns parlamentares, bem assim quando o texto é gestado no consciente popular é emendado com matéria estranha ou fulminado antes mesmo de ser debatido, atropelado pelas propostas mais interessantes à classe política detentora das cadeiras do parlamento nacional”, completou ele. Segundo o ministro, o Congresso violou o interesse popular ao sobrepor ao projeto tema completamente alheio aos anseios da população e, no mais, que servia aos interesses apenas dos parlamentares.
“No que diz respeito à emenda de plenário (…) que trata de crimes de abuso de autoridade de magistrados e membros do Ministério Público, para além de desnaturação da essência da proposta popular destinada ao combate à corrupção, houve preocupante atuação parlamentar contrária a esse desiderato”, afirmou.
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